Cornélio era desses homens pequenos, franzinos, tímidos, risinho fraco. Puxava uma perna, andava de cabeça baixa e pouco falava com os colegas de trabalho. Era de corar quando lhe contavam qualquer piada obscena. Muito competente e pontual no trabalho era por isso respeitado por todos na repartição pública. O típico cidadão comum daquela canção de Belchior.“Vivia o dia e não o sol, a noite e não a lua. Acordava sempre cedo, era um passarinho urbano. Era um homem de bons modos: Com licença; foi engano".
De casa para o trabalho e do trabalho para casa. Sair com os colegas para tomar uma cerveja depois do expediente, então, nem pensar!
Agora, o cabra era muito azarado. Eu digo azarado porque Cornélio teve a ousadia de se casar com uma belíssima mulher! Loura, olhos azuis e penetrantes, boca vermelha, carnuda, faces rosadas, sardenta, sorridente. Seios fartos e bunda torneada como numa escultura de porcelana, coxas grossas, pele dourada, perfumada. Um encanto de mulher. Uma manga-rosa!
“A manga rosa,
Peitos gostosos,
Rosados doces
Mama
Teu sumo escorre
da minha boca”.
Deixando a poesia de Ednardo de lado e voltando pra história, esse foi o primeiro azar de Cornélio. O segundo azar aconteceu numa dessas festas de confraternização de fim de ano. O chefe de Cornélio, um cabra corpulento, mãos grandes, bem-sucedido na vida, galanteador e assediado pelas mulheres, botou o olho na bela mulher de Cornélio. Foi uma olhada tão forte que todo mundo percebeu. Reinou assim um silêncio quando ela entrou de mãos dadas com o tímido e desengonçado Cornélio. Ela nem percebeu o grandalhão a comer-lhe com os olhos. Isso acabou com ele. Como pode? Ele um homem bonito, jovem, assediado por homens e mulheres! Como ela não percebeu aquela olhada fenomenal?
- Essa é a mulher do Cornélio? – perguntou para outro funcionário – Sério? Não acredito! Como é possível que uma deusa como essa pode ter casado com um sem-graça como esse feladaputa do Cornélio? – Essa mulher vai ser minha! Olha o que eu tô dizendo! Vai ser minha, nem que eu mate o Cornélio! Isso nasceu pra ser corno! – ameaçou, colérico, falando para si mesmo, entornando uma taça de champanhe e outra e outra e outra.
Cornélio e a mulher realmente faziam um casal destoante. No entanto, pareciam felizes. Trocavam mimos, beijinhos e não largavam a mão um do outro. Isso deixava o chefe de Cornélio inconsolável, febril, completamente bêbado, observando-os de longe como uma ave de rapina.
- Cuidado Cornélio! – disse um colega à boca pequena – O chefe tá de olho na tua mulher! Fica esperto que o chefe já comeu a maioria das mulheres aqui da repartição. Ele disse que vai te transferir pro interior, lá nos cafundós do judas, lá onde o cão perdeu as botas, só pra investir na tua mulher. Se eu fosse tu, ficava de olho bem aberto. Eu acho que ele não tá muito bem do juízo, não! Ele disse que tu nasceu pra ser corno! Tu sabe, né, chefe é chefe!
- Quanto mais chefe, mais chifre! – falou o Cornélio. – Eu vou mostrar quem é que nasceu pra ser corno. Pode deixar, que essa mulher nasceu pra mim e mais ninguém. Eu não tenho nem medo. Ela gosta de mim e pronto! Tanto que casou comigo. Pode deixar que posso não ser um galã como ele, mas não sou besta não! E pro interior é que não vou!
- Égua, Cornélio! Agora tu falou grosso! Gostei de ver!
No dia seguinte, o chefe de cornélio foi encontrado dentro do banheiro da repartição, numa poça de sangue, se esvaindo como um porco. O vaso sanitário partido ao meio, uma cena horrível. A polícia concluiu que fora um fatal acidente no vaso sanitário.
– Muito comum. – explicou o perito - Algo não muito divulgado. A louça não foi feita para suportar o peso completo do corpo. Acontece muito.
O chefe de Cornélio havia sido castrado no acidente. A polícia só não soube explicar como o saco escrotal foi parar dentro da boca do infeliz.
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